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A figura da incorporação de ações em cenário de planejamento tributário

São muitas as variáveis que influem na construção deste tipo de planejamento

Elaborado em 08/2010

Introdução

Por diversas razões, inclusive a de ordem tributária, cresce a procura, de pessoas físicas e jurídicas, por profissionais ou instituições que possam assessorá-los na formatação de planejamento tributário. São muitas as variáveis que influem na construção deste tipo de planejamento, e, cada caso concreto deverá ser analisado em seus pormenores, não se descartando, inclusive, questões sucessórias. Para se levar a cabo certo planejamento costuma-se ordená-lo em fases ("tranches"), sendo, cada uma das fases, exteriorizada por um instrumento jurídico adequado ao fim desejado. Entre estes instrumentos jurídicos, um dos mais utilizados é o da "Incorporação de Ações".

Incorporações de ações

Diz-se que ocorre a Incorporação de Ações quando uma pessoa jurídica (ou mesmo pessoas físicas) subscreve capital social de outra pessoa jurídica (existente ou em processo de criação) com o compromisso, firmemente declarado, de integralizar o valor subscrito mediante conferência de participações societárias (não necessariamente ações) emitidas por terceiros, mas de sua titularidade à data da subscrição do aumento capital social ou mesmo de sua constituição.

Decidido o emprego deste instituto legal, surge a questão nuclear da definição do preço do negócio. Estabelecido o preço da operação dele serão extraídas as consequências tributárias tanto para a pessoa jurídica emissora dos novos títulos de capital social (Instrumentos Patrimoniais) como para os subscritores destas novas participações societárias. Para a sociedade empresarial emissora será definido o custo de aquisição dos investimentos a serem alocados em seu ativo patrimonial e para os subscritores o preço de alienação dos ativos conferidos na subscrição.

Passemos, então, a demonstrar a importância da definição do preço da operação a partir de um exemplo hipotético:

1. Três pessoas físicas de uma mesma unidade familiar são detentoras de 100% das cotas de uma Ltda. com a seguinte distribuição do capital social registrado:

 

PESSOAS FÍSICAS Nº DE COTAS VALOR UNITÁRIO CAPITAL SOCIAL DETIDO PERCENTAGEM INDIVIDUAL
A 600.000 R$ 1,00 R$ 600.000,00 60%
B 100.000 IDEM R$ 100.000,00 10%
C 300.000 IDEM R$ 300.000,00 30%
TOTAL 1.000.000   R$ 1.000.000,00 100%

2. Os cotistas decidem então pela constituição de uma sociedade anônima administradora de bens e valores (holding) conferindo a totalidade de suas cotas para a formação do capital social da nova empresa.

3. Visando evitar a incidência de imposto sobre ganhos de capital das pessoas físicas, com amparo no art. 23 da Lei nº 9.249/95 (este artigo permite que pessoas físicas transfiram a pessoas jurídicas, em subscrição de capital, bens e direitos pelo valor constante de suas respectivas declaração de bens), os cotistas decidem que a conferência será feita pelo custo histórico de aquisição constante em suas declarações de bens.

4. Em seguida é feito o levantamento desses valores, a saber:

 

PESSOAS FÍSICAS Nº DE COTAS VALOR UNITÁRIO Custo Declarado
A 600.000 R$ 1,00 R$ 600.000,00
B 100.000 IDEM R$ 100.000,00
C 300.000 R$ 2,00 R$ 600.000,00
TOTAL 1.000.000   R$ 1.300.000,00

5. Diante deste quadro de valores decide-se tomar como parâmetro de valoração o menor valor de custo existente entre os cotistas, ou seja, R$ 1,00 por título transferido a nova "Holding".

6. O novo capital social da "Holding" será constituído de apenas 10 ações sem valor nominal, sendo o capital social estipulado em R$ 1.000.000,00.

7. Para a sociedade anônima em formação temos então o seguinte quadro de acionistas:

 

PESSOAS FÍSICAS Nº DE AÇÕES VALOR UNITÁRIO CAPITAL SOCIAL DETIDO PERCENTAGEM INDIVIDUAL
A 6 ------- R$ 600.000,00 60%
B 1 --------- R$ 100.000,00 10%
C 3 --------- R$ 300.000,00 30%
TOTAL 10   R$ 1.000.000,00 100%

8. Nota-se que o cotista "C", pessoa física, deverá promover, em sua declaração de bens, a substituição das cotas da Ltda., antes declaradas por R$ 600.000,00, pelas ações da "Holding" no valor de R$ 300.000,00 apontado uma perda patrimonial de R$ 300.000,00. Isto ocorre porque a Assembléia de Acionistas aprovou o valor de incorporação das cotas de R$ 1,00 por cada título transferido.

9. Apesar de não haver fluxo financeiro nesta operação a "Holding" está adquirindo investimentos em outra sociedade pagando tal aquisição com a emissão de títulos de capital social. Portanto o valor do capital social emitido é o parâmetro certo para a definição do preço da operação.

10. Quanto à escrituração contábil, dos investimentos adquiridos, na "Holding", em tese, teríamos o seguinte lançamento:

DÉBITO: INVESTIMENTOS RELEVANTES (NÃO CIRCULANTE)
CRÉDITO: CAPITAL SOCIAL
VALOR: R$ 1.000.000,00

11. Todavia este registro contábil não procede porque em se tratando de uma subsidiária integral (a "Holding" passa a deter 100% do capital social da limitada), deve-se aplicar o Método de Equivalência Patrimonial - MEP - desde a primeira avaliação do investimento. Portanto já sabemos que o valor contábil do investimento é de R$ 1.000.000,00, mas, é preciso se determinar o valor de patrimônio líquido do investimento bem como o ágio ou o deságio havido na operação.

12. Supondo-se que o valor do PL da Limitada fosse R$ 21.000.000,00, à data da constituição da sociedade anônima (a "holding") teríamos então o seguinte registro contábil:

DÉBITO: INVESTIMENTOS RELEVANTES R$ 21.000.000,00
CRÉDITO: DESÁGIO R$ 20.000.000,00
CRÉDITO: CAPITAL SOCIAL R$ 1.000.000,00

13. A "Holding" irá processar à devida realização do deságio (transferência para lucros ou perdas como conta de resultado) em uma única parcela, ou ao longo de certo tempo, sem que esta transferência influa na base de cálculo do IRPJ ou mesmo da CSLL, porque a amortização de deságio tem sua neutralidade tributária assegurada §2º do art. 25 do DL nº 1.598/77.

Acabamos de ver que em situação normal de "incorporação de Ações" apura-se deságio na aquisição dos investimentos, sendo o capital social emitido o parâmetro maior para a definição do preço da operação e desencadeamento das consequências tributárias.

Vejamos agora outro ângulo da mesma questão. Utilizando os mesmos dados numéricos do caso exemplo, tomaremos por hipótese outra definição da Assembléia de Acionista quanto à determinação do custo de aquisição do investimento.

a. Repitamos o mesmo quadro societário da limitada:

 

PESSOAS FÍSICAS Nº DE COTAS VALOR UNITÁRIO CAPITAL SOCIAL DETIDO PERCENTAGEM INDIVIDUAL
A 600.000 R$ 1,00 R$ 600.000,00 60%
B 100.000 IDEM R$ 100.000,00 10%
C 300.000 IDEM R$ 300.000,00 30%
TOTAL 1.000.000   R$ 1.000.000,00 100%

b. Repitamos o mesmo quadro de acionistas da "Holding":

 

PESSOAS FÍSICAS Nº DE AÇÕES VALOR UNITÁRIO CAPITAL SOCIAL DETIDO PERCENTAGEM INDIVIDUAL
A 6 ------- R$ 600.000,00 60%
B 1 --------- R$ 100.000,00 10%
C 3 --------- R$ 300.000,00 30%
TOTAL 10   R$ 1.000.000,00 100%

c. Agora os Acionistas da "Holding" decidem exigir um Prêmio de Subscrição dos cotistas da limitada de R$ 39.000.000,00 e aprovam a avaliação dos investimentos entregues em R$ 40.000.000,00, de tal forma que o registro contábil da operação na "Holding" seja o seguinte:

DÉBITO: INVESTIMENTO RELEVANTE (MEP) R$ 21.000.000,00
DÉBITO: ÁGIO NA AQUISIÇÃO R$ 19.000.000,00 (*)
VALOR CONTÁBIL DO INVESTIMENTO R$ 40.000.000,00

CRÉDITO: CAPITAL SOCIAL R$ 1.000.000,00
RESERVA DE CAPITAL/ PRÊMIO DE SUBSCRIÇÃO: R$ 39.000.000,00

(*) ÁGIO FUNDAMENTADO NA RENTABILIDADE FÚTURA DA SOCIEDADE INVESTIDA

d. Nota-se que a conta Reserva de Capital não representa efetiva contribuição à formação do capital social; ela foi inserida no Balanço Patrimonial apenas para equilibrar contabilmente a valoração espontânea levada a efeito pelos Acionistas da "Holding".

e. Este fenômeno não ocorre por acaso e se caracteriza como fase antecedente, ou preparatória, para fruição dos benefícios fiscais constantes do inciso III do art. 7º da Lei nº 9.532/97 (inciso modificado em sua redação pela LEI Nº 9.718/98) em que se empresta dedutibilidade à amortização de ágio fundado em rentabilidade futura em casos de incorporação, fusão, ou cisão de empresas.

Surge então a indagação maior: Podemos dizer que o preço da operação, no segundo, exemplo foi de R$ 40.000.000,00, porque este foi o valor da avaliação aceito pelos Acionistas da "Holding"?

Queremos crer que não.

Não é a expressão numérica que define o efetivo preço de uma operação e sim a extinção de direitos e obrigações entre as partes. De outro lado os Acionistas da "Holding" aceitaram pagar ágio na aquisição dos investimentos, mas, em contrapartida, exigiram prêmio de subscrição em igual montante - valores que se anulam por compensação entre as partes. Nem mesmo o argumento de que a Lei permite que este tipo de negócio seja feito a preço de mercado socorre aqueles que defendem o preço da operação em R$ 40.000.000,00. Tal preço seria juridicamente válido caso a operação fosse liquida por Instrumentos Patrimoniais (emissão de capital) no mesmo montante de R$ 40.000.000,00.

Deve-se ainda frisar que as contas do grupo "Reservas de Capital" têm a mesma natureza jurídica do capital social integralizado, vale dizer, estas contas devem indicar substância patrimonial efetiva, não se prestando a registros de contrapartidas de avaliações contábeis. De outro lado, já se consolida toda uma doutrina jurídica-contábil em torno dos pagamentos baseados em ações. Na moderna definição de Instrumentos Financeiros está consagrada a classe dos Instrumentos Patrimoniais como sendo aqueles instrumentos de capital social utilizados para adquirir ativos financeiros ou mesmo pagar passivos financeiros de uma entidade. Assim não se pode conceber que a conta Prêmio Recebido em Subscrição de Ações seja fonte de emissão de Instrumentos Patrimoniais para comprar ativos ou pagar passivos. Por si só a movimentação desta conta já indica o ingresso de valores no Patrimônio como ganhos ou vantagens auferidas em decorrência do capital social - efeito patrimonial similar a lucro auferido.

Vê-se que há uma verdadeira falácia gráfica contábil no segundo exemplo. A parte e a contraparte superestimaram os signos da transação sem impacto patrimonial correspondente para os contratantes. Ninguém paga e ninguém recebe, porque os valores se compensam.

Por tudo exposto, devemos concluir que caso a investida venha a incorporar a investidora (Incorporação Reversa), o beneficio fiscal pretendido - dedutibilidade da amortização do ágio - poderá ser glosado pelo Fisco tendo em vista que não há prova da existência do ágio pago, não se prestando para tal mero registro contábil falacioso. Ágio pago significa efetiva modificação patrimonial das partes contratantes.

Incorporação de empresa

Finalizando devemos assentar que não se deve confundir o instituto legal da Incorporação de Ações com o outro denominado Incorporação de Empresa. São dispositivos legais da Lei das Sociedades Anônimas - Lei nº 6.404/76 - distintos a versar sobre as matérias, como segue:

Art. 227. A incorporação é a operação pela qual uma ou mais sociedades são absorvidas por outra, que lhes sucede em todos os direitos e obrigações.
§ 1º A assembléia-geral da companhia incorporadora, se aprovar o protocolo da operação, deverá autorizar o aumento de capital a ser subscrito e realizado pela incorporada mediante versão do seu patrimônio líquido, e nomear os peritos que o avaliarão.
Art. 252. A incorporação de todas as ações do capital social ao patrimônio de outra companhia brasileira, para convertê-la em subsidiária integral, será submetida à deliberação da assembléia-geral das duas companhias mediante protocolo e justificação, nos termos dos artigos 224 e 225.


 

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